No início de 2020, o MyHeritage passou a oferecer um serviço complementar de colorização de fotografias antigas. Entretanto, devido às restrições à mobilidade impostas no contexto do combate à pandemia de COVID-19, o MyHeritage optou por tornar esse serviço temporariamente gratuito. Fomos testá-lo e deixamos aqui a apreciação, assim como alguns comentários adicionais e dicas sobre a colorização de fotos antigas. Em primeiro lugar, refira-se que a colorização de fotografias antigas não é um tema novo e que já há vários anos existem na Internet diversas aplicações com esse fim, algumas das quais gratuitas: em versão de teste, até um certo número de imagens, ou então sem limite de imagens mas com aposição de marca de água e/ou redução da resolução. Ora, a aplicação para colorir imagens disponibilizada pelo MyHeritage é, em geral, melhor do que outras que estão disponíveis. Na comparação que mostramos acima, pode ver-se como a aplicação do MyHeritage consegue perceber com maior facilidade onde está a vegetação, para a colocar em tons de verde, e ao mesmo tempo uniformiza melhor o fundo e separa melhor as cores. Monda do arroz em Coruche há cerca de cem anos atrás e respectiva versão colorizada (fotografia publicada em SOUSA, Fernando de / QUEIROZ, Francisco / SERÉN, Maria do Carmo et al. – Espólio Fotográfico Português / Portuguese Photographic Heritage. Porto, CEPESE, 2008, URL: http://www.franciscoqueiroz.com/Espolio_Fotografico_Portugues.pdf) Uma vez que a aplicação do MyHeritage em muitos casos é capaz de detectar a vegetação, fornece geralmente boas colorizações em fotografias de exterior, sobretudo se o que é verde tem uma incidência de luz mais ou menos uniforme, como nesta fotografia que mostramos de mulheres a mondar o arroz em Coruche. Contudo, os testes que fizemos à aplicação do MyHeritage permitem também concluir que a cor das roupas é geralmente problemática. Por vezes, surgem todas as vestimentas em tons muito ténues e com cores mais ou menos aleatórias, como se fosse assumida pela aplicação a incapacidade em detectar a cor autêntica mas, ao mesmo tempo, fosse criado algum tipo de coloração, para que o todo da imagem pareça realmente uma fotografia a cores. A fotografia também aqui mostrada de vários desportistas no Oporto Cricket Club em finais da década de 1920 permite deduzir este problema facilmente, pois os vários uniformes eram necessariamente todos iguais entre si, e as listas eram forçosamente da mesma cor de alto a baixo. Ora, a aplicação do MyHeritage (assim como outras aplicações semelhantes) dá como resultado colorações diferentes, às vezes até dentro da mesma lista de um dos uniformes, sendo que, na prática, os vários uniformes surgem com tonalidades desmaiadas e muito parecidas, quando na realidade seriam cores fortes para melhor se distinguirem as equipas. Um conjunto de quatro retratos em formato carte-de-visite que pertenceu ao espólio de uma família da Póvoa de Varzim também evidencia esta incapacidade do software de colorização, visto que se trata de uma só sessão fotográfica e, mesmo tendo sido a imagem carregada já em montagem, a aplicação não conseguiu reconhecer que a faixa na cintura da menina é a mesma em todas as fotos, surgindo por vezes acastanhada e outras vezes preta/azulada. Desportistas no Oporto Cricket Club há cerca de cem anos atrás (versão colorizada de uma fotografia publicada em SOUSA, Fernando de / QUEIROZ, Francisco / SERÉN, Maria do Carmo et al. – Espólio Fotográfico Português / Portuguese Photographic Heritage. Porto, CEPESE, 2008, URL: http://www.franciscoqueiroz.com/Espolio_Fotografico_Portugues.pdf) Sessão fotográfica com membros da família Sousa Calheiros da Póvoa de Varzim, possivelmente durante uma viagem que fizeram, atendendo ao timbre do fotógrafo (versão colorizada de uma ilustração publicada em QUEIROZ, Francisco / MOSCATEL, Cristina - Descubra as suas origens. Manual de Genealogia e História da Família. Lisboa, A Esfera dos Livros, 2016, https://genealogiasemsegredos.weebly.com/manual.html) Apesar de a fotografia colorizada com vários desportistas no Oporto Cricket Club apresentar dois deles com mãos de cores diferentes: uma da cor da pele e outra acinzentada, um dos pontos fortes da aplicação do MyHeritage é conseguir detectar não só os rostos como também as mãos, e mesmo as pernas. Este retrato de uma pastora da Serra do Caramulo tirado há cerca de um século evidencia bem essa capacidade. Aliás, a mencionada aplicação consegue fazer essa detecção mesmo em gravuras ou litografias, portanto em imagens não reais. Pastora do Caramulo há cerca de cem anos atrás e respectiva versão colorizada (fotografia publicada em SOUSA, Fernando de / QUEIROZ, Francisco / SERÉN, Maria do Carmo et al. – Espólio Fotográfico Português / Portuguese Photographic Heritage. Porto, CEPESE, 2008, URL: http://www.franciscoqueiroz.com/Espolio_Fotografico_Portugues.pdf) A aplicação do MyHeritage consegue também colorizar razoavelmente fotografias que não mostrem pessoas, quer vistas urbanas, quer vistas de campo - como a que apresentamos, do sítio de Porto Moniz nos arredores de Leiria (hoje parte integrante da cidade). Também neste género de imagens sem pessoas, a aplicação do MyHeritage consegue colorizar razoavelmente até as litografias, como a que mostramos abaixo, referente a Lisboa. Tal como sucede frequentemente com fotografias de pessoas, nomeadamente ao nível das roupas, também com as fotografias de paisagens a aplicação do MyHeritage tende a não assumir cores fortes, talvez para que, em caso de inverosimilhança, não se note tanto o erro. Porém, se as cores resultantes do processo de colorização não forem incorrectas face à realidade, esta característica da aplicação em análise facilmente pode ser contornada. Damos como exemplo uma fotografia antiga da fachada da Igreja dos Clérigos, no Porto. A aplicação do MyHeritage consegue clarear e azular partes do céu, e ainda distinguir uma árvore ao fundo. Ora, para obtermos uma imagem com cores mais aproximadas da realidade basta-nos utilizar depois um programa simples de edição de imagem e saturar mais as cores - o que é feito num só passo e, em muitos programas de edição de imagem pode até ser feito automaticamente se pedirmos ao software simplesmente para melhorar a imagem. Não poderíamos seguir este passo se a imagem não tivesse sido previamente colorizada. É importante referir que a aplicação do MyHeritage, além de colorizar, corrige os níveis do histograma da imagem, conferindo contraste se a imagem estiver baça. Porém, imagens muito baças à partida frequentemente dão maus resultados de colorização, mesmo tratando-se de retratos. Significa isto que um dos pontos fortes da aplicação em análise - o reconhecimento dos rostos - tende a não funcionar nas muito comuns fotografias da segunda metade do século XIX que estão bastante esbatidas, sobretudo se não forem retratos de corpo inteiro. Apresentamos aqui dois exemplos. Em ambos os casos, mostramos o resultado da colorização a partir da imagem original e o resultado da colorização após tratamento prévio à imagem original para lhe dar maior contraste. Pode verificar-se que, no caso da fotografia feminina em "close up", a aplicação confere alguma cor mas não distingue bem que se trata de um rosto. No caso da fotografia de tipo cartão-de-visita, a aplicação limita-se a alterar ligeiramente o tom sépia, mas não introduz qualquer cor, nem mesmo depois de conferirmos maior contraste à fotografia original. Para todos nós é óbvio que se trata de rostos, mas tudo indica que as aplicações de colorização, em geral, ainda têm bastante margem para evoluir, neste e noutros aspectos. Em alguns casos, os resultados já são muito interessantes e, no caso de retratos, conquanto tenham à partida bom contraste e o fundo seja neutro ou menos nítido que o que está em primeiro plano, de modo a ressaltar as silhuetas humanas, há fotografias antigas que literalmente ganham vida com a colorização, como a de três raparigas beirãs com o tradicional penteado "de martelo", fotografadas há cerca de cem anos atrás (ver abaixo). Portanto, nada como experimentar! Retrato feminino e versão colorizada, estando em baixo à esquerda uma versão com mais contraste e respectivo resultado da colorização (fotografia pertencente ao espólio da família do último governador de Moçambique e publicada em PORTELA, Ana Margarida / QUEIROZ, Francisco - A Casa de Tralhariz e a Capela do Bom Jesus. Porto, Instituto de Genealogia e Heráldica da Universidade Lusófona do Porto / GEHVID – Grupo de Estudos de História da Viticultura Duriense e do Vinho do Porto, 2008) Retrato de um homem de relevo na história da Ourém, estando em baixo à esquerda uma versão com mais contraste e respectivo resultado da colorização (fotografia publicada em QUEIROZ, José Francisco Ferreira - A Casa do Terreiro. História da Família Ataíde em Leiria. Volume III: Do Século XIX à Actualidade. Leiria, Fundação Caixa Agrícola de Leiria / Jorlis – Edições e Publicidade, Lda., 2018) Raparigas de Malpica do Tejo há cerca de cem anos atrás (versão colorizada de uma fotografia publicada em SOUSA, Fernando de / QUEIROZ, Francisco / SERÉN, Maria do Carmo et al. – Espólio Fotográfico Português / Portuguese Photographic Heritage. Porto, CEPESE, 2008, URL: http://www.franciscoqueiroz.com/Espolio_Fotografico_Portugues.pdf) Uma dica final e um conselho: Para evitar a marca de água que, no caso da aplicação do MyHeritage, é gerada no canto inferior esquerdo de cada foto, caso ainda não tenha digitalizado as fotografias que pretende colorizar, ao digitalizá-las não recorte as fotografias pelos limites mas deixe sempre uma margem em branco no rodapé. Depois é só recortar esse rodapé quando estiver colorizada e já não terá qualquer marca de água a atrapalhar. Também pode criar rodapé nas fotografias estando estas já digitalizadas, usando qualquer software simples de edição de imagem e ampliando a moldura para baixo. Não se esqueça que a colorização é um processo sem garantia de autenticidade nas cores, mesmo nos casos em que ela parece mais bem sucedida. Aliás, se pegar numa fotografia a cores e a gravar num ficheiro de imagem em escala de cinzas para depois a carregar na aplicação do MyHeritage (ou noutra qualquer aplicação para colorizar), é muito provável que algumas cores, sobretudo nas roupas, não batam certo com as cores que aparecem na fotografia a cores original. Por conseguinte, a bem do rigor, se pretende usar fotografias colorizadas em livros de família, por exemplo, não se esqueça de mencionar na legenda que a fotografia foi colorizada. Boas colorizações! Francisco Queiroz (projecto "Genealogia sem segredos")
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Genealogia sem segredos
Para uma Genealogia mais rigorosa, mais transparente e mais acessível a todos. Histórico
Dezembro 2021
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